Descrição da minha
viagem
a França
no inverno de 1929-1930
“Por alto”
Villars-de-Lans, 16 de Fevereiro de 1930
Carlos Abecassis Seruya
A Viagem
Partimos de Lisboa no dia 19 de Dezembro no Sud-Express. Bota-fora muito pequeno. No dia seguinte chegámos a Hendaya às 8,45. Encomendámos almoço no Hotel de Inglaterra e fizemos algumas “emplettes”. Almoço razoável. À 1,25 partimos para Marselha. Palestrámos no comboio com um sujeito de Toulouse. Deu-nos conselhos sobre precauções a tomar em Marselha. Uma viagem aborrecidíssima e fatigante. Deitei-me numa couchette e chegámos a Marselha às 4,45 da manhã. Alojámo-nos no Hotel Splendide. Os quartos cheiravam muito à tinta do radiador da chauffage. De manhã bato à porta da Tia Júlia e… muitos abraços e beijos, claro. Nessa manhã os lojistas devem ter embolsado alguns cobres e nós desembolsado. Almoçámos no Isnard. Bouillabaisse para a pança, que é um petisco bem bom. À tarde mais lojas e uma livraria ótima. Tomámos chá no quarto e jantámos no hotel.
No dia seguinte, Domingo 21, de manhã não saímos e à tarde fomos ao chá dansante na sala.
Segunda-feira fora da cama às 6 menos um quarto. Tomámos o comboio de Grenoble às 7,50. Muitos abraços e adeuses à Tia Júlia que partia para Nice às 8,30. Em Veynes eu e a Mãe descemos para irmos comprar uns “paniers”. Já estava a nevar: bom presságio!
Chegámos a Grenoble às 3,50. Subimos para Villard
no Rochet-Schneider do Adict. (Qual deles seria?)
Vimos os quartos, lavámo-nos e jantámos às 7,15. Falámos com os Ramos, etc… Esplêndida e linda sala de jantar.
De manhã nem pinga de neve. Ficámos algo desapontados.
Começou para nós uma vida regular e monótona.
No dia seguinte às 6,30 veio o Doutor Le François ver-nos.
Comprámos uma luge e quase todos os dias íamos para as ”pentes” com ela.
Chegou o dia 6! Dia bastante triste para nós. A Mãe foi-se embora e só! Mas correu tudo bem. Chegou sã e salva a Lisboa.
Comecei com a ginástica que era algo puxada e que me desenvolveu demasiadamente.
Fiz conhecimentos. Andávamos pouco com os Ramos. Estava lá gente rica e importante. Cointreau dos licores, Vuitton das malas, uma pequena de La Rochefoucauld, etc… Jogava imenso bridge, e à tarde, ia muitas vezes ver jogar. Jogadoras: M.me Colot, M.me Cointreau, Mlle Feu, Henri Vuitton, etc… Meus conhecimentos: Max de Foraz, Claude Puerari, George Marelles, Denise Vuitton, Henri Goudchaux, Jean Blériot, filho do aviador, etc… Dei-me mais com um rapaz de Cambrai, Robert Goudry de 21 anos.Muito simpático, correspondo-me com ele.
Os Ramos foram-se embora um dia e não nos deixaram saudades nenhumas.
Houve um concurso de “chasse-neige” e um banquete oferecido aos concorrentes.
Passou-se muito agradavelmente. Na vinda viemos num “Citroën” muito bonsinho. Tomámos o comboio de Marselha em Grenoble e chegámos lá às 6,50. Estava a Tia Júlia. No dia seguinte fizemos uma “tournée” pela cidade. Vimos Notre Dame de la Garde, o pont transbordeur,
a Corniche, etc…
Fomos ao Basso comer uma bouillabaisse. À meia-noite partimos para Bayonne. Em Bayonne onde chegámos às 2,50, fizemos algumas voltas e às 7,30 partimos para Lisboa onde chegámos 22,30 horas depois.